criptomeriaA Cryptomeria japonica é, hoje, considerada a espécie florestal mais importante do arquipélago dos Açores, não só pela sua importância económica, ocupando 60% da área de floresta de produção, mas também porque os seus povoamentos são um elemento estrutural das paisagens açorianas.

A criptoméria no seu ambiente natural: ecologia e etnobotânica.
A sua área de distribuição natural engloba o arquipélago japonês e as zonas temperadas húmidas ao longo do rio Yangtze, no sul da China, onde tem a denominação de Sugi. Apesar de não ser uma presença dominante nas florestas naturais, esta espécie mostrou ser uma das eleitas nas florestas plantadas.

A existência de plantações florestais de criptoméria no Japão reporta ao século XVI, quando a sua madeira foi muito procurada para a construção de templos budistas, sendo as plantas produzidas por semente e por estaca. Foram assim plantadas vastas florestas em torno dos locais onde se pensava construir os templos. No entanto, o seu uso é muito anterior e existem dados que provam a sua utilização em épocas tão antigas como 3500 a.C.

A relação especial que a cultura japonesa desenvolveu com esta espécie vai muito para além do sentido prático, ao ser fácil de reproduzir, crescer rápidamente e possuir um fuste erecto. É considerado que a textura e grão da madeira de criptoméria – de grão fino e linear, produzindo uma madeira macia mas consistente, com um alinhamento de veios, considerado perfeito – não só é esteticamente valorizada, como representa muito da filosofia de vida japonesa.

Embora de crescimento rápido nos primeiros anos, a criptoméria está entre as espécies de vida mais longa na Terra, sendo que o tempo médio de vida para os indivíduos mais velhos seja de 1600 anos, mas a indivíduos – como a Jomon Sugi e a Daio Sugi, tem sido atribuída uma longevidade/idade de cerca de 3000 anos. No Parque Nacional de Yakushima, estabelecido em torno de alguns dos povoamentos naturais mais monumentais desta espécie (Património da Humanidade desde 1993) existe uma relação muito profunda destas árvores com a cultura.

Os indivíduos maiores e mais velhos são muito respeitados e visitados, tendo cada um deles recebido um nome próprio um acesso específico.
Jomon Sugi é considerada como uma das árvores mais velhas, com 25,3 m de altura e 16,4 m de perímetro, na base. A maioria destes indivíduos está acima dos 700 m de altitude e são considerados dos menos monumentais de um passado recente, dado que os mais altos e de troncos rectos foram cortados para madeira.

É curioso que, tal como nos Açores foi no Japão, uma das espécies selecionadas para reflorestar o país após a Segunda Guerra Mundial, devendo‑se a essa política, tanto cá como lá, a vasta distribuição que a espécie possui.

A criptoméria é uma conífera que pertence à família Taxodiaceae, atingindo os 70 m de altura, na sua região de origem. De copa cónica  tem tronco direito, envolvido por uma casca acastanhada e fibrosa. As folhas são aciculares, rígidas, curvas, em forma de sovela, curtas, verde‑vivas e brilhantes.

As sementes estão suportadas num estróbilo globoso, pequeno, castanho‑avermelhado, quando maduro e em posição terminal.

Embora com uma distribuição que vai desde regiões temperadas, os maiores povoamentos de criptoméria encontram‑se em condições subtropicais, em que os valores de precipitação atingem 2540 mm anuais.

Geralmente em povoamentos mistos com carvalhos, são frequentes os povoamentos puros em encostas declivosas, com abundantes nevoeiros e ventos intensos. Estas condições são muito semelhantes às dos Açores e, por isso, não é de admirar que esta espécie, vinda de uma laurissilva, se tenha adaptado tão bem às montanhas do arquipélago.

Os primeiros povoamentos de produção Tal como as outras essências florestais vindas de longe, esta espécie foi introduzida nos Açores como árvore ornamental, em meados do século XIX, altura em que a constituição florística da ilha de São Miguel foi profundamente alterada, acontecendo o mesmo em quase todas as restantes ilhas dos Açores, devido ao alargamento da superfície arborizada com essências exóticas, em prejuízo do que resta da floresta original espontânea.

Em 1934, a composição da estrutura florestal da ilha de São Miguel caracterizava‑se pela existência predominante de matas de pinheiro‑bravo (Pinus Pinaster) (804 ha), de acácia da Austrália (Acacia melanoxylon) (570 ha) e de criptoméria (Cryptomeria japonica) (533 ha), uma realidade que, em nada, se assemelha à que temos, nos dias de hoje. Em 1951, a área arborizada nesta ilha não atingia os 6% da área territorial.

Esta percentagem estava muito aquém dos 35%, considerados como apropriados. Este valor reflectia a má situação em que se encontrava o sector florestal, resultante da inexistência de um correcto ordenamento do território, situação criada pela exploração desregrada e descontrolada, não compensada por correspondente plantação, tendo sido agravada pela Segunda Guerra Mundial.

Reconhecendo a existência de extensas áreas subaproveitadas de terrenos incultos particulares e de baldios, foram tomadas medidas pelo Estado não só a nível de protecção das áreas florestais, como de fomento silvícola, sendo então criada, em 1948, a Circunscrição Florestal de Ponta Delgada*, que prontamente elaborou e executou Planos de Arborização para os baldios existentes nas ilhas de São Miguel e de Santa Maria.

Foi então que se iniciaram os trabalhos de repovoamento florestal em larga escala, o estabelecimento de viveiros florestais, onde era gratuita a distribuição de plantios e sementes de criptoméria japónica pelos particulares, o aproveitamento silvopastoril e a construção de caminhos florestais e outras infra‑estruturas.

Esta instituição imediatamente pôs em execução legislação que obrigava os proprietários a rearborizar após o abate das matas, e condicionava os cortes de arvoredo e as transformações de culturas, travando o processo da exploração desregrada das áreas florestais.
Em 1960, são criadas as Circunscrições Florestais das cidades de Angra do Heroísmo e Horta, que deram continuidade a estes trabalhos nas restantes ilhas do arquipélago.

O aumento das áreas florestais, sobretudo com criptoméria, foi fruto da acção impulsionadora dos Serviços Florestais na Região que, nos últimos 40 anos, apostaram nesta espécie, atendendo ao seu melhor comportamento aos ventos, relativamente ao pinheiro-bravo, à acácia da Austrália e ao seu bom nível de crescimento.

Em 1989, a área florestal, que era de 6% em 1948, passou para 21%, na ilha de São Miguel. Este equilíbrio deveu‑se não só à acção de fomento dos Serviços Florestais como ainda ao esforço da iniciativa privada, à qual não era alheia uma certa tradição florestal da maioria dos proprietários, que até 1982 não tinha qualquer incentivo para arborizar a ilha.

A importância actual dos povoamentos de produção Nas últimas décadas, como resultado das políticas comunitárias e dos seus apoios financeiros, assistiu‑se a um surto de florestação de novas áreas e à rearborização de outras, ambas sujeitas agora a planos orientadores de gestão que garantem as boas práticas florestais. Reportando‑nos somente à floresta de produção, em termos globais, esta é claramente dominada pela Cryptomeria japonica. Esta espécie ocupa, no todo regional, uma área de 12.500 hectares aproximadamente, o que representa cerca de 60% da floresta de produção regional.
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Adaptação ao meio açoriano: crescimentos, ecologia e sensibilidades.
Nos Açores, a Criptomeria japonica é subespontânea mas de forma tão limitada que o seu comportamento pode quase ser classificado de cultivar.
Na verdade, apenas em alguns vales de solos mais quentes (águas termais, por exemplo), geralmente em clareiras das matas plantadas, se encontra reprodução a partir da semente.

Nas restantes áreas, a espécie foi, de facto, plantada, tendo sido a sua reprodução realizada em viveiro. A criptoméria, criptomé, cedro‑do‑japão, ou simplesmente cedro, como tem vindo a ser vulgarmente conhecida, ou até mesmo como árvore do Natal (dado a progressiva tradição de utilizar esta espécie como o símbolo natalício) encontrou, nestas ilhas, um clima semelhante ao da sua origem. A elevada precipitação, nas zonas montanhosas, bem distribuída ao longo do ano, e uma humidade relativa elevada, são fundamentais ao seu crescimento que, nesta região, é susceptível de formar bons e aprumados fustes e de se verificarem, com frequência, crescimentos médios anuais superiores a 20 m3/ha/ano (da mesma ordem de grandeza das plantações de eucalipto do Continente).

À excepção de algumas situações, onde as condições do solo constituem efectivamente um constrangimento, o vento é o principal factor limitante, quer na instalação de novos povoamentos, quer na manutenção da estabilidade de povoamentos adultos.
Quanto aos crescimentos, a classe de qualidade média para os Açores ronda os 23 m3/ha/ano, o que corresponde a um volume final de 690 m3/ha de indivíduos com idade permitida, por lei, para a realização do corte (30 anos),.

Aos 30 anos, uma árvore apresenta uma altura dominante média de 21 m e um diâmetro médio de 28,1 cm a 1,30 m. No Japão, os acréscimos médios são de 12 m3/ha/ano para povoamentos explorados aos 40 anos, mas a rotação, por vezes, é alargada até aos 60 anos.

Esta espécie regenera de forma natural nos Açores, onde ocorre uma abundantíssima frutificação. Mas o repovoamento das áreas exploradas não é viável sem o recurso à plantação, devido à baixa capacidade germinativa da semente, e à elevada competitividade de infestantes como a conteira (Hedychium gardneranum), a silva (Rubus inermis), a acácia (Acacia melanoxylon) e o incenso (Pittosporum undulatum), que proliferam muito rapidamente nas zonas que foram sujeitas a corte, não dando oportunidade à germinação da semente de criptoméria, que é claramente uma espécie de luz.

Os povoamentos são instalados geralmente em zonas bastante declivinosas em que os solos são mais difíceis de trabalhar e situam‑se, em média, acima dos 400 m de altitude. São essencialmente as condições orográficas que condicionam a plantação e exploração dos povoamentos, salvo raras excepções de arborização em pastagens, as operações de instalação dos povoamentos são exclusivamente manuais, devido à topografia do terreno.
É uma espécie plástica quanto ao solo, mas suporta mal os terrenos com má drenagem.

Em terrenos de escórias vulcânicas (bagacinas), apesar da grande espessura efectiva, se os horizontes superficiais forem pouco desenvolvidos, os crescimentos do povoamento são reduzidos, o que se reflecte na qualidade da madeira, apresentando esta uma densidade superior à verificada em solos mais evoluídos. Prospera quer em solos planos, quer sobre vertentes abruptas, entre os 150 e os 800 m, com um crescimento muito rápido.

A nível sanitário, a única dificuldade que esta espécie encontra, actualmente, nos Açores, é a incidência da Armillaria mellea. Este fungo ataca os povoamentos não só de Criptomeria japonica, como de outras espécies florestais, com prejuízos na qualidade da madeira e condicionando a rearborização nas áreas afectadas. Neste domínio, a Direcção Regional dos Recursos Florestais, através do seu Plano de Melhoramento Florestal, está a apostar na propagação de árvores de criptoméria resistentes a este fungo, através da selecção de uma variedade de cerne negro de existência mais rara, efectuados na Região reconhecem carácter resistente.
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Técnicas de produção e tipologia dos povoamentos
No arquipélago dos Açores, o sector silvícola é constituído por 2 grandes grupos: a floresta de produção e a floresta de protecção. Embora não haja uma fronteira clara e bem definida entre o que se possa considerar floresta de produção e floresta de protecção, uma vez que, dada a natureza dos solos locais e o acidentado do terreno, a floresta plantada desempenha um importante papel de protecção, ocupando 35% da área total de floresta nas ilhas, sendo os restantes 65% floresta de protecção.

A presença de floresta de criptoméria em altitude, nas ilhas dos Açores, onde o regime da maioria das ribeiras existentes é, actualmente, torrencial, contribui para um importante aumento das reservas de água, através da captação de nevoeiros e da água das chuvas, pelas copas das árvores, e para o combate à erosão dos solos, causada pelo vento e precipitação.

Esta espécie é também largamente utilizada em cortinas de abrigo nas explorações agro‑pecuárias. A sua densa copa constitui um obstáculo ao vento, protegendo os animais e contribuindo para um bom rendimento da pastagem. São estas estruturas agro‑florestais que fazem com que o verde dos Açores assuma várias tonalidades.

Relativamente à silvicultura da espécie, normalmente utilizam‑se compassos de instalação de 1,7 × 1,7 m a 2 × 2 m, embora os povoamentos adultos, hoje existentes, tenham sido instalados com compassos inferiores a 1,5 × 1,5 m. A densidade de plantação varia entre 2500–4000 árvores/ha.
 verificando‑se o mesmo na instalação dos povoamentos artificiais no Japão.

Os povoamentos que actualmente se aproximam do termo da revolução, nos Açores, apresentam em média cerca de 1900 árvores/ha, valor que reflecte a fraca incidência de desbastes até à idade de revolução.

A Direcção Regional dos Recursos Florestais assegura, anualmente e em toda a Região, a produção de plantas de criptoméria, para além de outras espécies para áreas de produção, e de endémicas destinadas às zonas de protecção. A propagação, em viveiro, é sempre feita por semente e, após 2 anos (1 + 1) de viveiro, as plantas estão aptas para a plantação.

A estacaria é utilizada apenas em ensaios no âmbito do melhoramento florestal, e a rebentação de touça não é significativa, de modo a ser considerada uma forma de regeneração dos povoamentos. Tradicionalmente, a semente utilizada na produção de plantas era proveniente de cortinas de abrigo, ou de árvores de bordadura dos povoamentos f lorestais.

Hoje em dia, o Programa de Melhoramento Florestal, levado a cabo pela Direcção Regional dos Recursos Florestais tem vindo a desenvolver diversas acções, que resultam na obtenção de semente seleccionada, com o objectivo de produzir plantas de qualidade superior.
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A madeira de criptoméria – vantagens e inconvenientes.
Sendo explorada em fustadio, a criptoméria produz uma madeira macia e fácil de trabalhar, leve e duradoura que, no entanto, estala facilmente quando pregada, sendo empregue frequentemente em construção civil (cofragens), carpintaria de limpos, mobiliário e caixotaria. A frequência de ventos nos Açores, conjugada com a rapidez de crescimento da espécie produz anéis de espessura muito heterogénea, excêntricos e com grande incidência de lenho de tensão e tracção, pelo que a estabilidade da madeira, para produção de peças de grandes dimensões, não é das melhores.

Com efeito, a madeira com melhores características tecnológicas é produzida nas estações de pior qualidade, onde os crescimentos são menores.
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O plano estratégico para o desenvolvimento da silvicultura dos Açores.
No arquipélago dos Açores, a floresta ocupa, actualmente, uma área aproximada de 70.000 hectares, o que corresponde a uma taxa arborizada média por ilha de 30%.

A partir de 1994, com a entrada do II Quadro Comunitário de Apoio e das medidas de Acompanhamento da Política Agrícola Comum (PAC), foram criados, nos Açores, instrumentos de incentivo à arborização de terras agrícolas do sector privado, e à arborização e rearborização de áreas não agrícolas, assim como à beneficiação de povoamentos já existentes do sector público e privado. Este tipo de incentivos comunitários resultaram, segundo os dados mais recentes do inventário florestal da Direcção Regional dos Recursos Florestais, no aumento da taxa de arborização na Região Autónoma dos Açores. Actualmente, a ilha de São Miguel tem uma taxa de arborização superior a 25% e detém mais de 70% dos povoamentos de Criptomeria japonica.

Estes incentivos comunitários têm igualmente favorecido uma afectação correcta dos solos, o que conduz a um ordenamento territorial equilibrado, tendo em conta as suas características físicas e climáticas. Nas áreas que se submeteram às ajudas comunitárias, há obrigatoriedade de implementação de uma silvicultura adequada à espécie plantada, recorrendo às operações de condução de povoamentos.

Na condução dos povoamentos de criptoméria realizam‑se limpezas interespecíficas e retanchas até aos primeiros 3– 5 anos de idade, altura em que o copado começa a fechar e a suprimir o sub‑bosque.

Posteriormente, entre os 7–9 anos de idade, efectuam‑se 1 a 2 limpezas intra‑específicas, removendo‑se as árvores dominadas e mal conformadas, e 1 a 2 desramações, em período semelhante. Apesar de ocorrer uma boa mortalidade natural dos ramos, resultante da elevada densidade de plantação, é frequente os mesmos permanecerem por muito tempo presos na árvore, dando origem a nós mortos, que desvalorizam grandemente a madeira. As desramas são, deste modo, necessárias para a obtenção de material lenhoso com qualidade superior.

O modelo de silvicultura para uma classe média de produtividade de “21 m” (altura dominante = 21 m aos 30 anos) da criptoméria prevê ainda a realização de 2 desbastes pelo alto mistos, aos 18 e aos 23 anos, de forma a garantir às árvores que deverão permanecer até ao final da revolução melhores condições de crescimento, estimando‑se que aos 30 anos, idade de corte, se obtenha uma média de 1200 árvores/ha.

Estes incentivos à florestação e rearborização vão continuar a existir, no III Quadro Comunitário de Apoio, cuja orientação principal será a de tornar sustentável a produção florestal. Deste modo, de acordo com as características deste sector na região, a Estratégia Florestal Regional definiu, como objectivo global, aumentar a contribuição da floresta para a economia e para a melhoria do ambiente, reduzindo o seu carácter subsidiário e residual na Região Autónoma dos Açores.

Esta estratégia concretiza‑se nos seguintes objectivos: aumentar a competitividade (qualidade e eficiência) do sector florestal com vista a uma floresta sustentável; apoiar a valorização profissional, promovendo o aumento do conhecimento ao nível das competências florestais; garantir a redução de riscos relativos à flora invasora, pragas e doenças, e a melhoria da viabilidade vegetativa e da sanidade dos povoamentos florestais; contribuir para um correcto ordenamento físico do território açoriano para a protecção, valorização e gestão dos seus recursos naturais e dinamizar o uso múltiplo da floresta.

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araucariaExistem nos Açores pelo menos três espécies deste género de coníferas gigantes do hemisfério Sul. A mais emblemática, com uma forte presença na paisagem dos Açores é a espécie Araucaria heterophylla, plantada em diferentes datas desde o século XVIII em locais públicos e jardins privados, como marco na paisagem.

A espécie Araucaria heterophylla foi descoberta pelo Capitão Cook na sua segunda viagem de circum‑navegação, ao passar pela ilha de Norfolk a oeste da Austrália, de onde é endémica. O famoso Capitão ficou impressionado com esta árvore, de forma piramidal quase perfeita, e de altura que pode atingir os 60 m. Julgou que daria óptimos mastros, para além do nobilíssimo valor cénico que trazia à paisagem, como se se tratasse do símbolo das viagens em torno do mundo.

Ao trazer plantio desta espécie para Inglaterra, dedicou‑a, num gesto romântico, bem ao gosto da época, à rainha, sendo a espécie cultivada nos jardins reais. Este poderoso e imponente símbolo vem a ser trazido para Portugal sendo plantado em Lisboa no Jardim do Monteiro Mor (actual Jardim do Museu do Traje) no Lumiar. Trata‑se da araucária mais antiga do país; plantada por Jacome Ratton no final do século XVIII, e também a primeira plantada na Europa ao ar livre.

Mais tarde, em meados do século XIX, vem a ser plantada em Sintra, por Francis Cook, quando estabelece o seu jardim em Monserrate, um harmonioso e exuberante conjunto artístico e ambiental onde se sente, de uma forma viva e marcante, o “glorioso Éden” que Lord Byron tão bem soube cantar.
Este indivíduo tem hoje 50 m de altura e 22 de diâmetro e será o maior do continente português.

Nos Açores esta espécie é igualmente introduzida nos jardins românticos, com grande êxito e crescimento rápido, dando imponentes marcos na paisagem (algumas das árvores açorianas poderão mesmo ultrapassar as medidas referidas, mas nunca houve uma medição exacta das mesmas).

A sua boa adaptação aos Açores, em particular pela sua resistência aos ventos e ao sal, permite‑lhe ser uma das poucas árvores que se destacam na paisagem. Por isso, muitos jardins românticos vêm a adoptar, nas diferentes ilhas, esta espécie como o seu elemento central. Mais tarde salta dos jardins privados para o passeio público, onde é utilizada para marcar pontos ou datas memoráveis.

É assim que, na visita real de D. Carlos, no início do século XX, aos Açores, alguns dos pontos de visita, como que num memorial, são marcados pela plantação de Araucária.

Hoje estas árvores fazem parte da paisagem cultural dos Açores e constituem importantes marcos na estrutura visual das ilhas. Associadas a agregados urbanos nobres e ajardinados, a sua forma piramidal tem significados estéticos e míticos, pois que sobressai na paisagem aplanada das ilhas assemelhando‑se a mãos postas que se erguem ao céu, construindo uma ligação entre o terreno e o transcendental, aproximando‑se do significado fundamental do jardim.

 

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incensoIncenso (Pittosporum undulatum Vent.).

Pittosporum provém do grego e significa “sementes pegajosas”. Undulatum provém do latim undulatus, ondulado, referindo‑se à margem das suas folhas. Esta espécie é originária do Sudoeste da Austrália, mas com uma distribuição bastante mais alargada, surgindo em zonas de climas quentes de África, Ásia, ilhas do Pacífico e Nova Zelândia, desenvolvendo‑se naturalmente em florestas húmidas.

É cultivada como ornamental em muitos locais distintos no mundo. Contudo, em certas condições ambientais esta espécie comporta‑se como invasora, tal como acontece no Brasil, no Hawai, Jamaica, África do Sul e outras ilhas do Pacífico e Atlântico.

Pittosporum undulatum Vent. é um micro‑mesofanerófito perene que atinge alturas de 10 a 15 m. Ritidoma cinzento com forte nodosidade na zona de inserção dos ramos e imediatamente abaixo desta. A copa é piramidal, com 3 a 5 m de diâmetro. As folhas são perenes, ovado‑lanceoladas e de margem ondulada (dando nome à espécie). As folhas, quando esmagadas, produzem um odor pungente, de que deriva o nome dado pelos açorianos de “incenso”. As flores agrupam‑se em cimos, com pétalas brancas e lanceoladas e um forte aroma na maturação.

Os frutos são cápsulas, glabras que de verde passam a cor de laranja quando maduros, resinosos e com um forte odor.

Em Portugal Continental o Pittosporum foi introduzido como ornamental de jardins e para sebes. Tem actualmente o estatuto de invasora sendo especialmente problemática na Beira Litoral e Estremadura. Nos Açores, esta espécie conhecida por incenso ou faia do Norte, foi introduzida há mais de 150 anos, primeiro para fins ornamentais e depois para a implantação de sebes.

Tendo encontrado condições de tal modo favoráveis, “escapou” do domínio do Homem, invadindo uma parcela considerável da zona compreendida entre o nível do mar e os 500 m, mudando profundamente o aspecto das paisagens açorianas. Constitui actualmente uma das principais invasoras da região sendo, sem dúvida, a espécie que provocou alterações mais profundas na paisagem e na flora natural de baixa e média altitude.

Trata‑se de uma planta muito pouco exigente em termos de nutrientes do solo, adaptada a condições secas e expostas a ventos, formando aglomerados muito densos que impedem o crescimento de outras espécies pelo que estas formações são normalmente muito pobres em termos de biodiversidade vegetal.

Existem referências que apontam para que uma só árvore possa produzir 37.500 sementes. Além disso, o incenso, tem uma grande capacidade colonizadora e de regeneração. Grande parte das florestas naturais de costa e meia altitude, nomeadamente faias e florestas laurifólias, foram profundamente alteradas e mesmo extintas devido à invasão desta espécie.

Existem outros problemas associados à presença de incenso. São plantas de grandes dimensões, bastante pesadas e promotoras de profundas alterações estruturais do solo. Assim, quando ocorrem em zonas de encosta, são frequentemente associadas a derrocadas.

Este problema existe por exemplo nas encostas de algumas fajãs na ilha de S. Jorge, anteriormente usadas para vinha, recentemente abandonadas e actualmente ocupadas por matas de Pittosporum, em grave risco de derrocadas.

A distribuição e os efeitos associados à presença do incenso é, nos Açores, um problema cuja solução (se existir) se apresenta muito difícil considerando a dimensão actual do problema. Realça‑se que esta rebenta por toiça e de raiz, o que torna a remoção mecânica cara e trabalhosa (em muitos casos impossível devido à instabilidade do local), sendo sempre necessário que o corte seja acompanhado pela aplicação de produtos químicos, com todos os inconvenientes que tal processo pode acarretar. Se a solução é difícil, o alastramento do problema poderá ser minimizado, com medidas que limitem o abandono da terra e promovam a limpeza das matas por parte dos seus proprietários.

Acima dos 500 m de altitude, e devido essencialmente aos elevados níveis de encharcamento, a planta não se consegue adaptar e os seus efeitos são minorados ou inexistentes.  O incenso é considerada uma espécie de pouco interesse em termos de madeira, sendo esta de natureza dura (utilizada, pelo seu grão, em Santa Maria, para elaboração de colheres de pau). Nos Açores, é frequente agricultores usarem sazonalmente a ramada desta planta na alimentação de gado bovino. Na região foram já efectuados diversos estudos que visam o aproveitamento desta espécie, mostrando a sua potencialidade como substrato de culturas hortícolas.

 

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acaciaAcácia (Acacia melanoxylon R. Br.).

A segunda espécie mais importante na actualidade, no sector florestal, mas de facto a terceira na constituição da paisagem florestal dos Açores é a acácia. Sob esta designação existem várias espécies, mas a mais importante é a designada acácia preta (Acacia melanoxylon R. Br.). É uma folhosa persistente, originária da Austrália, que em tempos ocupou grandes áreas dos Açores.

A designação popular de pau‑para‑toda‑a‑obra revela o interesse desta espécie em marcenaria. No entanto o comportamento da sua madeira é pouco satisfatório para obras finas. Possui capacidade de se propagar vegetativamente e por semente, nos Açores.

As suas raízes superficiais podem avançar muitos metros e voltar a rebentar, e as suas sementes têm capacidade de germinar nos solos mais secos. De facto, o encharcamento é um dos poucos factores que limita a expansão desta espécie, que em alguns locais de baixa altitude tem comportamento invasor, Figura 4.40 (por exemplo nos Mistérios da Prainha, na ilha do Pico). Não só nos Açores, mas noutras partes do Mundo, é considerada uma das acácias mais conhecidas, por ser uma invasora temível que tem causado muitos problemas nos ecossistemas.

Sendo a Acacia melanoxylon R. Br. uma Leguminosa (família Leguminoseae) pertence à sub‑família Mimosacea. Esta mimosa apresenta, normalmente, um porte arbóreo médio, atingindo entre 8 a 15 m de altura podendo, por vezes, atingir os 20 m. É uma árvore de folha perene, com uma copa densa piramidal ou arredondada. As folhas são filódios laceolados a oblanceolados, ligeiramente curvadas e geralmente verde escuras.

Tem um tronco direito, com o ritidoma de cor cinzento acastanhado escuro e com ranhuras. Os ramos aparecem desde perto da base do tronco e têm geralmente uma disposição horizontal ou mesmo pendular. As inflorescências são compostas por capítulos globulares de côr amarela pálida. Os frutos são vagens castanho‑avermelhadas, mais estreitas que as folhas, algo comprimidas e torcidas. As sementes são rodeadas por pedículos vermelho‑rosados ou escarlate.

É nativa das florestas tropicais do Sudeste da Austrália e da Tasmânia. No entanto, tem sido disseminada pelo resto do Globo, sobretudo devido às suas propriedades ornamentais e ao valor da sua madeira negra. A sua presença começou a ser verificada nas ilhas do Pacífico, na Nova Zelândia, nas ilhas do Oceano Índico e na África do Sul.

Inicialmente, foi reconhecida como uma invasora nociva na África do Sul e hoje está em todos os continentes. Tem ainda povoamentos importantes na ilha do Pico em todas as encostas norte da ilha e em alguns núcleos dispersos nas ilhas Terceira e São Miguel. No entanto, o seu interesse decaiu fortemente com a entrada no mercado da madeira de criptoméria. Porém, o futuro destes povoamentos residuais não é preocupante, do ponto de vista de conservação, uma vez que o incenso facilmente recobre estas áreas e inibe a propagação de juvenis ou rebentos da acácia. Não quer dizer que seja melhor, mas sempre é menos uma espécie a levantar preocupações.

Antes do domínio da criptoméria existiram, com alguma dominância, outras folhosas, nos Açores, plantadas para a produção de madeira.
É o caso das tílias (Tília tormentosa, T. americana e T. x europeia), muito apreciadas pela sua madeira para marcenaria e com interesse ornamental e melífero; dos plátanos (platanus hybrida) em povoamentos até aos 300 metros de altitude; do tulipeiro‑da‑virginia (Liriodendrum tulipifera), grande árvore, produtora de óptima madeira e muito ornamental, para além das já citadas roseira e carvalhos. Também aqui a madeira de criptoméria desviou os mercados.

As madeiras de baixo interesse económico foram substituídas por esta, com proveito para as serrações. Nas madeiras nobres, o preço da importação tornou‑se compensador, em comparação com a produção local.

 

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azevinhoO azevinho Ilex azorica (Loes.)

A espécie Ilex azorica Loes. – azevinho – é endémica dos Açores. Trata‑se de uma espécie arbórea, com altura máxima que rondará os 8 m, na actualidade, mas muito mais alta em indivíduos centenários extintos, correspondendo ao único elemento da família Aquifoliaceae na flora natural.

É um fanerófito dioico, mas com evidentes vestígios de gineceu nas flores masculinas, que se desenvolvem em cimeiras axilares. As folhas são orbiculares, mucronadas, com margens pouco serrilhadas contrariamente a outras espécies do género, com excepção das plantas jovens.

A esta família estão associadas mais de 500 espécies, largamente distribuídas nas zonas tropicais, subtropicais e temperadas dos dois hemisférios. O azevinho encontra‑se presente em todas as ilhas do arquipélago, excepto na Graciosa.

Apesar do seu estatuto na lista vermelha dos Açores, ser de baixo risco (LR), sem necessidade de medidas de protecção, mas de tendência para vulnerável, o seu estado de conservação não é igual em todas as ilhas, evidenciando discrepâncias acentuadas em termos da sua abundância. Em Santa Maria encontra‑se ameaçada e no Corvo apenas um indivíduo foi reportado, estando no limiar da extinção.

A singularidade desta planta, relativamente às suas parentes madeirenses e canarienses, resulta do facto de fazer parte do pequeno lote de espécies estruturadoras das florestas açorianas. O azevinho é um elemento característico das florestas nativas mesófilas de altitude acima dos 500 m, formando uma tipologia de floresta endémica dos Açores – florestas de azevinho – distinguindo‑se pela sua forte componente norte‑atlântica das restantes formações florestais da Macaronésia.

Estas estão associadas a condições de extremo encharcamento e de abrigo em encostas ensombradas e sujeitas a ventos frios. Por isso, apresentam actualmente uma distribuição pontual, face à competição do Homem por espaços onde esta naturalmente ocorreria.

A importância desta espécie expressa‑se, também, no ecossistema açoriano, como sendo um recurso alimentar fundamental para o priolo (Pyrrhula murina, passariforme endémico de São Miguel), que se alimenta quase exclusivamente dos botões florais do azevinho no final do Inverno e, por isso, constitui um alimento crítico para esta espécie, sendo considerada a frequência e distribuição do azevinho um dos possíveis factores ameaça à população de priolo.

A distribuição actual de Ilex azorica indica uma tendência altitudinal marcada ocorrendo associada a zonas altas e muito húmidas, que pode resultar da modelação antropomórfica da paisagem. Apesar das descrições antigas sobre as florestas de baixa altitude não referenciarem a presença de azevinho, em condições ombrotróficas pontuais poderiam permitir a ocorrência da mesma, o que é sustentado por dados fósseis encontrados nas bacias de Angra do Heroísmo e Ponta Delgada.

O Ilex azorica, tal como outras espécies deste género, encontra‑se associado à simbologia natalícia e é usado como um dos principais elementos decorativos dos arranjos da quadra. As suas ramagens são verde escuras constratantes com os frutos vermelho vivo.
e a sua maturação dá‑se no início do Inverno.

A intensa utilização dos azevinhos não se resume a este apontamento festivo no decorrer do ano. Os Açorianos encontram outros usos para esta árvore, levando em alguns casos a uma exploração que terá tido consequências na sua distribuição e abundância. O uso de ramagens para alimentação de gado bovino/caprino é uma prÁtica que remonta aos inícios do povoamento como se pode aferir por esta citação do cronista Frutuoso “Há muitos azevinhos a que cortam a rama para os gados principalmente para o vacum, que faz tanto por ela que onde a ouve cortar com machado vem a correr para comer, e desTe ardil usam os moradores para ajuntar seus gados com pouco trabalho”.

Esta prática moldou inclusive alguns aspectos da paisagem açoriana, podendo-se encontrar em algumas ilhas, como no Pico, pastagens tipo montado, em que o azevinho faz parte da estrutura da pastagem, quer funcionando com sebes de abrigo, quer mantendo um suplemento alimentar para os animais.

Os usos do passado, talvez motivados pelo extremo isolamento A que as ilhas estiveram sujeitas, trataram de ser, pelo menos nos recursos que chegaram ao início do século XX, cuidadosamente sustentáveis. É o caso da exploração do azevinho endémico, utilizado como ramagem verde para o gado, em particular o caprino, e para manutenção de prados a média altitude, deixando indivíduos desta espécie pelos campoS, que funcionavam como colectores de nevoeiro e matéria verde.

Em qualquer dos casos, as árvores eram moldadas por podas e desramas cuidadosas. O corte de saberes e conhecimentos da terra, que se deu nos tempos recentes levou a alterar estas práticas para algo mais letal e que está a colocar esta espécie rapidamente na lista vermelha: são utilizadas motoserras para a aceder á sua folhagem… cortando as árvores pela base, mesmo nos lugares mais recônditos.

Actualmente, uma nova ameaça se desenha, bem mais silenciosa mas perigosa: a introdução, com fins ornamentais, de outras espécies de Ilex. Sabendo que existe possibilidade de hibridação entre as espécies próximas e, na ausência de legislação e acções de fiscalização que proíbam a importação de outras espécies próximas das endémicas, assiste‑se a uma proliferação de azevinhos introduzidos nos jardins. A confirmar‑se o cruzamento, este poderá levar à extinção do Ilex azorica, tal como o conhecemos e à sua substituição pelo híbrido.

 

In Espécies florestais das ilhas, Eduardo Dias, Carina Araújo, José Fernando Mendes, Rui Elias, Cândida Mendes e Cecília Melo
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